terça-feira, 3 de junho de 2014

Diferentes endereçamentos um mesmo objetivo.

          Basta sair na rua e somos interpelados por diferentes artefatos midiáticos... Opa, sair na rua? Deixe-me reconfigurar isto. Basta estar em algum lugar e somos interpelados por veículos de informação e por apelos de ordem consumista. Nos dias atuais o acesso à tecnologia é muito diferenciado do acesso que tínhamos a cinco ou dez anos atrás, de forma que seja em casa ou andando pela rua nosso cotidiano é permeado por diferentes signos da cultura consumista veiculados, muitas vezes, a partir de elementos da tecnologia.

Muitos aparatos tecnológicos estão de alguma maneira relacionados a conteúdos midiáticos, em sua maioria, de ordem consumista. Nesta conjuntura social ‘[...]. O ”consumismo” chega quando o consumo assume o papel-chave que na sociedade de produtores era exercido pelo trabalho’. (BAUMAN, 2008, p. 41). Em casa vemos e ouvimos os apelos midiáticos nos instigando a consumir a partir de veículos como a televisão e o computador a partir do acesso a internet. Nas ruas estes apelos ganham maior dimensão com propagandas em forma de out-doors, colados nos muros da cidade, no centro comercial, nos transportes públicos, enfim, em tantos formatos e tamanhos. Quando próximo de datas festivas (muitas elaboradas e impostas nos meios sociais pela própria mídia) estes artefatos se multiplicam e muitas vezes nos sobrecarregam de informações.

Em uma dessas andanças pelos caminhos do dia-a-dia nos causou curiosidade uma propaganda inscrita em forma de imagem em um out-door.  Este trazia a imagem de um menino estereotipado de Funkeiro, com correntes no pescoço, anéis e um relógio grande que demonstrava ser de ouro. Junto do menino havia uma mulher sentada em uma poltrona grande e luxuosa, simbolizando um trono. Junto a esta imagem os dizeres: “Bom mesmo é ser você” e “Mês das mães Gaston”.

            A partir disto buscamos conhecer a propaganda que foi utilizada pela marca para divulgar na televisão os produtos a serem comercializados. 


Nela aparecem inscritas representações de infância e da figura da mãe. Estereótipos que buscam configurar o que é ser criança e o que é ser mulher e mãe na sociedade atual. Mais do que objetivar o apelo ao consumo a partir de produtos ditos “essenciais” para este modelo de mãe-mulher esta propaganda aporta para um consumo de sentidos e imagens. Afinal, ao sermos interpelados por propagandas midiáticas não consumimos apenas os produtos a que direcionam nossos olhares, mas também os sentidos e significados implicados na forma de ser-representar das propagandas. A partir destas percepções incorporamos, em diferentes medidas, a nossas identidades características vendidas pelos discursos impostos explicitamente e/ou entre linhas nas propagandas e demais programas televisivos. Nesse sentido Bauman (2008) complementa esta discussão ao demarcar que

Os membros da sociedade de consumidores são eles próprios mercadorias de consumo, e é a qualidade de ser uma mercadoria de consumo que os torna membros autênticos dessa sociedade. Tornar-se e continuar sendo uma mercadoria vendável é o mais poderoso motivo de preocupação do consumidor, mesmo que em geral latente e quase nunca suficiente. [...]. (p. 76) [grifos do autor]

            Nesta compreensão surgem no convívio social sujeitos que nada são e que ao mesmo tempo podem ser/ter várias identidades. No espaço-tempo atual a cultura infantil e as crianças são permeadas por diferentes concepções em relação ao seu lugar em nossa sociedade. Por um lado, as crianças ainda são percebidas como seres inocentes, reprodutores de informações, por outro, são vistas como grupo consumidor, com potencial de compra, que seleciona os produtos comercializados segundo seus interesses e desejos. Estas percepções aparecem misturadas no comercial analisado ao endereçar sua proposta à criança com o papel de filho considerando-a sujeito com extenso potencial de compra e sujeito central para comprar um produto endereçado também às mães.

             Ao utilizar diferentes linguagens (música, cores, elementos de cenário, expressões faciais e corporais dos protagonistas da propaganda, etc.) a propaganda aqui analisada traz dois sujeitos centrais para endereçar seus propósitos: o sujeito filho e o sujeito mãe. Entretanto não estrutura diferentes objetivos a cada um. A ordem ainda é a mesma. Consumir. A partir destas percepções ficam as perguntas para constantes reflexões: O que temos consumido? Em que medida somos educados pela mídia? Quantos ‘rótulos’ já compramos?


BAUMAN, Zygmunt. Vida para consumo: a transformação das pessoas em mercadoria. Tradução Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro. Zahar, 2008

Elisângela e Renata.